Ainda que o mundo fosse acabar de
fato, ainda assim teria recusado quando o chamaram para dançar. Gostava da música
e até cantarolou quando não tinha ninguém olhando. Mas o lugar era o mesmo, as
pessoas eram as mesmas, o barman era o mesmo. Ele era o mesmo. A certeza veio
quando deixou escorrer a bebida pelo canto dos lábios secos. Era uísque da
primeira vez que pedira, mas agora não sabia ao certo... Deveria haver algo
entre conformismo e vontade rodopiando liquefeito pelo copo e esbarrando vez ou
outra nas pedras de gelo. Quiçá dissolvesse a alegria irrealizada presa na
garganta. Tomou outro gole.
O cabelo, despenteara no caminho. O
colarinho manchado e puído, a gravata frouxa, caindo torta pelo peito feito
cruz. Os olhos úmidos e cinzas. Foram chamas um dia e talvez algo que renascesse em breve. Mas não sabia
ao certo. Se o mundo fosse mesmo acabar, teria dito à moça da recepção o quanto
achava que ela era bonita? Teria chamado-a para sair, teria sorrido, teria
aceitado quando o convidaram para dançar? Quem sabe. O mundo não acabaria. Não é?
Mas não se pode morrer engasgado
de alegria, rapaz! Teria que gritá-la ao mundo antes de ir. Ou tomar para si e
engolir, enfim. A iminência do fim aceleraria as sístoles e as diástoles e os
desastres e o mundo ficaria mais bonito, de repente. Um coração batendo,
ofegante aos suspiros.
Mas o mundo não acaba. E ainda há
tempo de pedir mais uma dose de autocomiseração. Sem gelo, dessa vez. E
tropeçar em poesia ao cruzar a porta.
“Que não seja
imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.”
Mas que seja infinito enquanto dure.”
Quem sabe um dia.