Eu matei um homem. E venho matando-o desde sempre. Desde
antes de ser e ter aprendido a vomitar sobre o papel palavras que fui engolindo
aos pouquinhos: verdades inventadas, mentiras amargas e, só vez ou outra, uma
letra cinza.
Matei um homem e guardei sua alma na gaveta de meias. O
corpo deixo por aí, arrastando-se pelos cantos enquanto acredita que é algo além
de um bando de ossos e pele e órgãos, nos quais não resta o menor resquício de
vida. Quebrei todos os espelhos da casa para que, quando esbarrar os olhos, não
ecoe de dentro tamanho vazio... zio... io.
E os copos, enchi-os todos. Duas pedras de gelo: uma para
a solidão da outra. Se grito assim, escondendo minha culpa detrás das linhas, é
porque já desisti de me importar. E viro as costas antes de ver você, a quem
minhas palavras talvez atinjam (como talvez pendam inertes e se percam pelo
caminho).
Matei um homem. A noite é fria e a manhã é cinza. Temo que
este homem seja eu.
"Desde antes de ser e ter aprendido a vomitar sobre o papel palavras que fui engolindo aos pouquinhos: verdades inventadas, mentiras amargas e, só vez ou outra, uma letra cinza." Não me pergunte o porquê, mas foi meu trecho preferido.
ResponderExcluirMe tocou, não sei se entendi da mesma forma que você, mas acho que também mato uma mulher, quando sufoco as palavras que deveriam ser transformadas em textos, quando sufoco os sonhos, as vontades.
E o layout do seu blog é o mesmo do meu.